sábado, 6 de abril de 2013

SOPRO DOS CÉUS


Que pedaço de mim é esse
espelho do passado
Que me dá orgulho
e medo?

Que gente é essa
trindade
que me envolve,
enrola
e me faz sentir
Grande?

É uma coisa forte,
complexa,
Amor profundo,
desejo de ver bem,
de poder cobrir com meu manto
o trio
assim como de deixar
viver
Sós.

Que coisa foi essa,
atordoante,
que um dia se instalou
em mim, cabeça, coração,
pra nunca mais sair,
esquecer?

Quem são esses
Elfos, duendes ou gnomos,
Gênios,
que me exigem poder hercúleo,
Heterodinâmico, sobrenatural,
ou me jogam no fundo do mar?

É um prazer enorme de me ver,
transformar,
de ouvinte a locutor,
Mestre sobrenatural a simples
mortal,
Representante dos céus,
Suprassumo da grandeza
a inocente leigo das coisas
que eles podem me ensinar.

Desses argonautas de olhos verdes-cré
que singram eternamente no oceano
instável da minha vida só posso dizer que é
grandioso demais
ouvir um dos três me chamar:
"Venha cá, Meu Pai".
OLHOS ABERTOS

Sabe aqueles dias em que o coração amanhece chorando, mas mesmo esse sofrer é reconfortante?

A dor da paixão perdida tão presente se fazia, que a necessidade de um novo alento dominava, levando à busca - eterna procura dos mal-amados - de algo diferente do todo-dia, talvez apenas para não ver a face que não se afastava da memória ou de um rosto novo que apagasse da lembrança, nem que por alguns momentos, a vida que, dia-a-dia, tinha jogado fora acreditando estar construindo e de repente assim, passando, encontrei uma beleza totalmente diferente do padrão que procurava. Não tinha nada a ver com o que incomodava, não parecia com a paixão que apertava o âmago, não era nada conhecida, mas encheu os olhos.

Dançar a noite inteira, rir, galante, cortês, cortejando e cortejado, namorado perfeito para a princesa que, encantada, sucumbia aos mágicos acordes das canções românticas e dançáveis que escolhia, fascinado com aquela presença deliciosa que ali flertando, mimosa, amenidades dizia, querendo partir, mas, agradada, contente, que dava a ficar, pedindo mais uma música.

E assim, nesse dançar e flertar, foi-se a noite e ao deitar, só, sono veio sem preocupações, como se Morfeu, completando o trabalho de Cupido, piedoso a alma envolvesse e desse relaxamento total.

Ao novo dia contemplar, eis que a dor que outrora o coração triturava amena veio, dando a impressão de consolo, como que lembrando que sem sofrer não se dá valor aos sentimentos, como que dizendo que o aperto
no íntimo era prova de vida e que a vida merecia ser vivida.

Visita, loucura enfrentada com arroubos de calor, um sorriso mais íntimo, uma carícia sutil, um passeio mais longo, novas palavras, ideias agradáveis, um conhecer e ser conhecido, deixar que o tato venha - todo um sonho se fazia realidade.

E nesse vai-e-vem, como em um carnaval de alegria, mais íntimos ficamos até que, sem nem sequer sabermos se podíamos ser vistos, noite se fez e acobertados pela noite amantes viemos a ser.

Pode acreditar, não sabia mais quem eu era, não conseguia lembrar que algo doía, paixão lancinante e alucinante, doce e envolvente era apenas o que conseguia sentir.

Então, naqueles mares azuis dos olhos daquele anjo louro mergulhava, com ânsia e sofreguidão há tanto sem exercício e quanto mais a olhava, mais queria ver e tanto mais via mais a queria sentir e a sentindo mais queria mergulhar dentro do seu ser, corpo e alma, naquela roda-viva do amor que se descortinava.

Novamente veio o fascínio da véspera e docemente envolvido pelo carinho que me dava, com ternura pelo seu cheiro inebriado, do seu calor provei. Temperatura exata, qual luva em mão certa, casaco perfeito em ombros no frio, encaixe completo e bem feito de seres maravilhados, louco, muito louco, com seu amor estive até que, no depois, palavras maliciosas a sussurrar e sentir, com tanto prazer, até a vida comum nos alcançar, malevolamente, como se para dizer que todo o sonho era uma necessidade mútua de ser feliz, como felizes o fôramos.

Hoje me vem essa lembrança alentadora, tão forte, que dá até vontade de voltar àquele momento e espaço para tentar reter o tempo ou, ao menos, o seu cheiro...
DRAGÃO

Durma, sonhe
Descanse,
Eu velo seu sono.

Eu sou o Dragão
Eu sou a força e o fogo,
A brisa
O mormaço
Eu tenho o bafo.

Eu fiz Merlin
O Mago
eu sou o fraco
eu viro água
Eu sou o sonho.

Sou seu pesadelo...
eu tenho o bem
e o mal.

Eu sou o dragão chinês
Toda a força
sem controle
Todo o carinho
lhe fazendo um ninho.

Eu sou o general
que manda o infante á luta
Eu sou o guerreiro valente
ante o fraco
Eu sou o covarde
que antevê a dor
e foge.
Eu fui o cavaleiro que procurou
o limite do mundo
Eu achei o Graal
E dei a Percival.

Eu ensinei o segredo da pólvora
ao chinês
Eu fui Marco Polo
Trazendo a explosão
da bomba
Para o Ocidente

Eu inspirei a bomba
Atômica.
Eu domei o átomo
para a paz.

Eu sou o mago
do Escaravelho de Ouro
Eu estive em Sullivan
e contei a Poe.

Eu vivo em Orion
e sou toda a Antares
eu moro na onda
eletromagnética,
ou do mar.

Eu escutei Mozart
e adorei
Fiz a inveja de Viena a
Salzburgo,
Não sem antes o inspirar
Com o Fígaro.

Durma, sonhe
Vou contar outra história
Eu sou o Dragão
que acordou
após tanto tempo descansando
do esforço de cobrir a terra
com o nevoeiro
da mudança.

Eu sou o Dragão
que expira perfume
que transpira orvalho
que fecunda a terra
Que nunca diz adeus
que está preso na ideia
ou imaginação.

Eu sou o dragão
da dúvida.
Fato ou ficção?

Eu sou o dragão
Mas também sou o pombo.
Durma e sonhe,
Sonhe comigo,
Sonhe como quiser

Traga sua lança
ou uma trança
Domine o Dragão,
seja minha criança

Sonhe,
Durma,
comigo.
MOMENTO


Pintou. Assim de repente, como todas as coisas de sabor exótico, mais fortes, ou emoção. Bem o tipo que vem, dá tesão e depois deixa de água na boca.

Esse foi o momento em que ele se sentiu gente, o momento da concretização da magia do bem estar, do amar a si próprio; nunca o prazer quase físico de uma sensação lhe tinha aparecido, se feito real.

Figura louca, sofrida, perdida, durante anos na busca de um algo, alguém, não sabia o que, mas buscava. Buscava tanto que se perdia, complicava o simples, querendo dar tudo de si para ser agradável, para se agradar.

Nessa busca, tentou fazer muito de pouco e fez um pouco de tudo, estilo cotidiano variado - quer dizer, não se conformava (não conseguia se conformar) com nada repetido e ainda assim vivia se repetindo. Não porque quisesse, nem que soubesse, mas simplesmente porque no marasmo do dia-a-dia tudo se lhe apresentava igual, mesmo que estivesse armando uma nova, aprontão que era.

Discípulo de Casanova, D. Juan e outros mestres da arte da alcova, acreditava adorar sexo, embora fizesse apenas com técnica, sem arte; fazia sexo sem sabor.

Acreditava ser artista, ou, ao menos, ter arte em si, precisava buscar inspiração.

Só, acompanhado da multidão; triste, na ansiedade da ilusão de uma festa.

Sem que nem mas, olha em volta. Mira o seu castelo derrubado, sua inexpugnável fortaleza não existe mais. E isso é bom. Estranho como pode algo tão significante, resistente, renitente até, desaparecer e isso ser bom. Foi aquele momento de sensibilidade, quando as coisas tocam, tipo as-palavras-certas-na-hora-certa, mas sem palavras, sem tempo, que tempo não é nada senão lenitivo para o sofrer, uma borracha macia para apagar, sem manchas, as linhas da memória.

Aí começou o seu instante.

Nunca um momento foi tão longo, tão passado e, paradoxalmente, futuro; só o presente não existia mais. Descortinou-se um outro ser e, não se sabe como nem por que, se sentiu espectador do seu próprio espetáculo, diretor impotente perante a performance dos artistas que, assim como se em laboratório, tiravam arte da vida - ou vida da arte - e ele mesmo era o protagonista.

Linda, doce, amarga como fel, horrível mas aliciante sensação de não mais querer e tudo vir.

Não era bem não mais querer; só não havia mais a urgência da busca. Não achou, mas lhe veio, assim como uma estrela linda, clara, fulgurante, apaixonante, para lhe trazer um céu. Um céu à noite, pontilhado, Capricórnio, Escorpião, Virgem, Sagitário, espelhado na enseada calma e sem remanso de um ser atônito e maravilhado.

A criança percebeu ter crescido sem saber e ali estava, novo, diferente, confuso com a nova realidade simples e deveras tocante daquele instante de toques.

Contudo, não perdera sua alma infantil, não perdera a ingenuidade que é necessária para se comover e assim riu. Um riso confuso, convulso, quase um choro de alegria. E essa alegria, ninguém pode precisar quando, evaporada se fora, roubada, massacrada ou, talvez, só perdida ou abandonada durante a busca e, mesmo assim, um dia ele tinha implorado poder tornar a sorrir mas, no seu devaneio, nem sentiu que o sorriso nunca se apagou, que a chama continuava acesa.

Mas o momento veio, a realização da vida chegou e nesse momento ele foi céu, centro, órbita, foi feliz.

Então foi ele...